29 de dezembro de 2010

Ter. 23:21 - 23:51

Café novo. Este café, em Coimbra, é suposto ser o café por excelência dos intelectuais. É normal ver aqui montes de gente com portáteis ou livros para ler. Hoje, porém, a esta hora, não foi isso que me calhou na rifa. O café está a abarrotar de gente, em grupos de entre duas e sete pessoas, tudo à conversa. Com seis mesas à minha volta com gente que facilmente olha para o que eu estou a fazer, não é de admirar que me sinta um bocadinho intimidado. Não é normal ficar intimidado quando escrevo, que eu me lembre só me aconteceu uma vez, quando o café estava a abarrotar de gente e era tudo famílias com putos (foi quando falei que tinha ganho estatuto de observador, se quiserem vão ver. Não falo do assunto, mas como verão não escrevi muito.). Ok, digam-me o que acham disto como técnica de engate (não se riam já): olhar sempre para a mesma pessoa enquanto escrevo, dando-lhe a impressão de que estou a escrever sobre ela. A ideia é que ela se aperceba disso e, das duas uma, ou faz cara de má ou de lisonjeada, e nesse caso curiosa pelo que eu estou a escrever. Talvez funcione só se fizer isso vários dias com a mesma pessoa. De qualquer forma, não me sinto ainda intere... já não sei o que ia a dizer. O casal ao lado está no engate. Ao contrário do outro casal ao lado, não se acariciam de vez em quando, mas ambos têm as mãos em cima da mesa, provavelmente na esperança de se tocar inadvertidamente. Acho um piadão a estas coisas. Tocam-se no ombro de vez em quando, aquelas palmadas de amigos mas que na realidade os amigos nunca dão. Ela olha para ele como se não percebesse a nada do que ele estava a dizer mas também não lhe interessasse minimamente. As mãos em cima da mesa... que pormenor estúpido, mas que faz todo o sentido! Será que é inconsciente? Não tenho a certeza mas acho que me lembro de ter feito isto em tempos. O toque subreptício e involuntário das mãos era electrizante... Se a memória não é inventada, lembro-me simplesmente de experimentar a sensação de contacto com a outra pessoa, e de querer experimentá-la, mas não me lembro de pensar que, ao fazer o mesmo que eu, ela poderia estar a sentir, a pensar o mesmo que eu. Incrível. Esta noite promete, para estes dois.

27 de dezembro de 2010

Seg. 14:58 - 15:28

E pronto, passou-se o Natal sem que eu escrevesse nada. O problema com o Natal e o blogging é que nesta época parece que é obrigatório que qualquer post seja sobre o Natal. Se escrevemos uma história normal parece que não se ajusta à quadra. Eu acabei inconscientemente por atrasar o próximo artigo do blog oficial porque não o queria transformar num post de Natal. Não é difícil, basta acrescentar coisas como "era véspera de Natal quando..." ou "estava nas compras de Natal quando..." e está feito. Aliás, a mesma facilidade é aplicada às músicas: não sei se já repararam, mas peguem numa música qualquer e acrescentem sinos a tocar por trás. E pronto, fica automaticamente convertida numa música de Natal! Gostava de ouvir, por exemplo, tipo, Moonspell, com sinos por trás. Era capaz de ficar giro. Bem, a minha indignação do dia de hoje é: não ter recebido chocolates pelo Natal. Ou devem achar-me muito fino para receber chocolates ou então substituíram-nos por garrafas de vinho e licor, que de repente passou a ser o presente banal por excelência para homens, sendo os chocolates reservados para as mulheres. Não é que não desgoste das garrafas de vinho, mas por norma não compro chocolates para mim e também gosto de os comer, por isso não era mau que mos oferecessem... Bem, além de vinho recebi livros, roupas, um jogo e um dvd que já tinha visto e tenho de trocar. Curiosamente recebi apenas um dos itens da wish list do meu blog oficial. Nem sei para que é que a tenho, quando afinal toda a gente me vem na mesma perguntar o que é que eu quero para o Natal. Suponho que ficará para memo pessoal. Em tempos escrevi no blog oficial (depois apaguei) que a wish list era uma boa maneira de conhecer uma pessoa. Faz algum sentido porque conhece-se melhor uma pessoa sabendo o que ela lê ou vê na televisão, e também pelo que ela quer ter. O problema em geral é que assim parece que a pessoa é muito materialista e que só lá tem a lista para que lhe ofereçam essas coisas. O problema da minha wish list em particular: está cheia de jogos Wii. E jogos Wii são caros, e por isso difíceis de oferecer. E então os outros artigos vão saindo da lista, mas os jogos permanecem, dando a ideia de que não quero mais nada da vida senão jogos. E não, não é essa a ideia.

22 de dezembro de 2010

Qua. 14:44 - 15:14

Havia muito mais para falar de ciência e religião e livros escritos há milhares de anos mas para já vou ficar por aqui. Mais tarde voltarei à carga. Normalmente nos meus registos tenho tendência para me indignar com as coisas (o blog oficial é quase um compêndio de indignações) e por vezes tenho a necessidade de lighten up e take it easy. Ontem estive a tomar conta da minha sobrinha de um ano e notei uma coisa engraçada nos bebés. Parece ser um facto que a primeira palavra que eles dizem é efectivamente mamã (ou mais raramente, papá). Mas acho que é um engano os pais pensarem que a criança chama por eles, só porque eles repetiram essas palavras tantas vezes para ela. It's the other way around. Ou seja, para compreendermos isto temos de pensar exactamente do ponto de vista contrário. O Stephen Hawking (e outros, decerto) fala nos seus livros de um princípio antropológico, ou antropomórfico, já não me lembro bem do nome. É um princípio que se deve ter em conta quando fazemos perguntas como porque é que o Universo é como é, porque é que tem estas leis da física, porque é que permite a existência de vida, em suma, porque é que tem condições tão perfeitas para a nossa existência (isto tem um pouco mais de background, mas para já basta saber que se algumas constantes absolutas do Universo variassem em uma milionésima que fosse, o Universo como nós conhecemos já não existiria - e nós também não). E a resposta é que só essa conjuntura é que permitiu a existência de seres pensantes como nós que questionam o Universo. Isto é o mesmo que considerar que existem ou existiram uma infinidade de Universos, grande parte deles sem qualquer possibilidade de albergar vida, e por acaso um deles produz seres humanos, e esses somos nós. Temos de pensar ao contrário, nós não existimos porque o Universo é assim, o Universo é assim porque nós existimos. Da mesma forma, voltando aos bebés, se calhar o papá e a mamã chamam-se papá e mamã precisamente porque são essas as primeiras sílabas que o bebé consegue articular. Foi assim que os nossos antepassados lhes puseram o nome. Com a evolução dos tempos já nos esquecemos do que pai e mãe querem dizer e então imaginamos que o bebé começa a chamar pela mãe quando diz "mamamamama". Mas depois não estranhamos quando ele diz outras coisas que para nós são incompreensíveis (por exemplo, "aaaa... bu!"). Na mente da criança na verdade passa-se outra coisa: primeiro começa a dizer coisas sem significado como "mamamamama" e "papapapapa" e só mais tarde, depois de tanto ouvir coisas como "sim, a mamã já vem" é que pensam "espera, então aquela coisa que eu andei a dizer que não tinha sentido nenhum afinal é o nome daquela senhora que me vem consolar quando eu choro? Uau, que coincidência!" Por isso, papás e mamãs, da próxima vez lembrem-se que não foram vocês que ensinaram os vossos nomes aos vossos filhos: eles é que os ensinaram a vocês.

18 de dezembro de 2010

Sáb 11:37 - 12:07

Para clarificar o que quero dizer com a minha desconfiança dos produtos naturais: não defendo que se deva sempre preferir os produtos sintéticos em detrimento dos naturais, mas acho que se deve ter um olhar crítico para os produtos ditos naturais, tal como se tem para os sintéticos. A minha segunda desconfiança é em relação a livros que já foram escritos há milhares de anos e hoje são tidos como dogmas. Para já, e isto é um aparte em relação ao que quero dizer, e facto de acreditarmos em coisas que já foram escritas há dois ou três mil anos fazem de nós uns burrinhos. Quer dizer que todos os sábios viveram naquela altura, e temos vindo a emburrecer desde então, porque afinal a verdade está toda nesses textos e não precisamos de aprender mais nada. Fim do aparte. Faz-me confusão que uma pessoa nos dias de hoje com um problema por resolver vá buscar a resposta a esse problema à Bíblia, ao Talmud, ao Alcorão ou a outro livro do género. Como é que acham que podem comparar a realidade de há dois mil anos com a realidade de agora? É que a ideia de que um texto é bom e actual só porque persiste ao longo dos tempos sem se modificar é completamente errada. O texto persistiu ao longo dos tempos não porque sempre esteve certo, mas porque ninguém teve a coragem de o questionar. A principal diferença entre a ciência e a religião é que a ciência se baseia na premissa de que qualquer teoria, qualquer explicação dada por nós para o estado actual do Universo, está à partida errada, que pode e deve ser refutada ou confirmada. Ao longo da história da Ciência todas as grandes teorias científicas, aquelas que são dadas na escola, foram refutadas. Kepler provou que Copérnico estava errado, Galileu provou que Kepler estava errado, Newton provou que Galileu estava errado, Einstein provou que Newton estava errado. E Hubble e outros provaram que Einstein estava errado. Sim, claro que todos estes acertaram alguma coisa, cada um deles deu o seu contributo para que ficássemos mais perto da verdade. Mas o que disseram não são dogmas, não são verdades absolutas. É assim que devia ser.

1 de dezembro de 2010

Qua. 11:55 - 12:25

O meu professor de ioga acredita mais na espiritualidade do que no método científico. E até goza um bocado com este, dizendo que nós precisamos de ouvir que alguma coisa está "cientificamente provada" para podermos acreditar nela. Suponho que para ele a medicina ayurvédica seja mais eficaz do que a medicina convencional, moderna e tecnológica. Tudo bem, não esperaria outra coisa de um professor de ioga. Mas irritou-me um bocado quando um dia destes ele se insurgiu contra os micro-ondas. Chegou a fazê-lo até num tom de ameaça e ironia, dizendo "Bem, eu não tenho micro-ondas em casa, agora vocês é que sabem, se quiserem morrer mais cedo..." Uma coisa é desconfiar de algo de tecnologia superior só porque não se sabe muito bem o que acontece lá dentro (ena, mete-se lá dentro, carrega-se num botão e aquilo aquece sozinho! Magia!), outra coisa é evangelizar essa desconfiança, esse medo do desconhecido, para um grupo de 30 pessoas. Está mais que provado (sim, "cientificamente" provado, acreditem ou não), que a radiação de micro-ondas não tem qualquer efeito nocivo sobre a comida, a não ser o efeito óbvio de a aquecer, por vezes demasiado se não tivermos cuidado. Para quê essa necessidade de assustar as pessoas? Imaginem que era ao contrário, que o micro-ondas já se conhecia há milhares de anos e que só agora se descobria que se podia cozinhar a comida num forno a gás. O que não diriam dos efeitos nocivos do gás sobre a comida, do calor excessivo, do potencial cancerígeno da comida esturrada... O fogo azul seria certamente obra do Diabo! Há duas coisas de que costumo desconfiar, no que toca a estas coisas da natureza e da espiritualidade. Primeira, o abuso da palavra "natural". Aceita-se tudo o que é natural e rejeita-se tudo o que é manipulado pelo homem. As lojas de produtos naturais apregoam-se a si próprias e aos seus produtos com o chavão do natural, dizendo subliminarmente que há uma forte probabilidade de que estes produtos não resultem (e assim convencendo os clientes a aceitar que assim seja), mas também não fazem mal a ninguém, porque são naturais. Sabem o que é que também é natural? Cannabis, que usada de forma errada pode alterar o estado mental, provocar alucinações e dependência. Sabem o que é que também é natural? Cogumelos venenosos, que basicamente matam quem ingerir nem que seja uma pequena porção. Depois esquecem-se que grande parte dos medicamentos é também baseada no que se encontra na natureza, eles simplesmente se limitam a retirar o que não interessa. E existem produtos como as delícias do mar que são totalmente sintéticos (embora baseados em produtos naturais) e, afinal, até fazem bem.